domingo, 18 de julho de 2010

Essa tal logística, por Evilazio de Oliveira da Revista Carreteiro

crescente profissionalização do transporte rodoviário de cargas, com a utilização de métodos de gestão cada vez mais avançados e de um sistema de logística capaz de atender com eficiência e rapidez às demandas dos clientes em qualquer parte, recai, sempre, nas mãos do carreteiro, que se constitui no elo final de toda essa operação. As grandes empresas se organizam e os caminhões ficam modernos e possantes, porém muitas vezes o motorista não está acompanhando essa evolução, ou, em muitos casos, nem ao menos sabe o que está acontecendo.

De acordo com uma definição da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), "logística é a ciência do planejamento e de realização da movimentação das forças, abrangendo o desenho, desenvolvimento, aquisição, estoque, movimentação, distribuição, manutenção, evacuação e disponibilização de materiais", entre outros itens.

E, segundo definição do CLM (Council of Logistics Management), de 1986, e incluindo o conceito de Supply Chain Management, é a parte do processo que planeja, programa e controla, eficientemente, o fluxo e armazenagem de bens, serviços e informações do ponto de origem ao ponto de consumo de forma a atender às necessidades dos clientes.

Em Uruguaiana/RS, na fronteira do Brasil com a Argentina e importante local de passagem de caminhões de carga entre os países do Mercosul, a diretora comercial da Ruver - Transporte & Logística, Vera Lucia Guedes Maidana, 46 e 16 de profissão, garante que em termos de logística o Brasil está cerca de 10 anos atrasado, comparado com Argentina e Chile, como exemplo. Ela e o marido, Rubem de Carvalho Maidana, 45 anos, responsável pela parte Operacional, donos da Ruver, mantém uma frota de 45 veículos próprios e outros 105 agregados, com 70% dedicados ao transporte de produtos químicos, principalmente para o mercado internacional. A empresa existe há 16 anos, com três departamentos que cuidam de todo o sistema logístico, desde a coleta, armazenagem, desembaraço, aduaneiro e a entrega no destino.

Segundo Vera Lucia, todos os veículos são equipados com rastreadores e monitorados durante 24h. Além da constante preocupação com os motoristas, que devem rodar a uma velocidade máxima de 80 km/h, há também paradas obrigatórias para descanso e determinação para trafegar até às 22h. Ressalta que nos 16 anos de existência da empresa ocorreram apenas três acidentes, mesmo assim causados por terceiros. A preocupação com a logística e com a eficiência operacional faz com que a Ruver realize cursos de atualizações para os funcionários, incluindo motoristas.

De acordo com Rubem Maidana, mesmo assim, ainda permanece a dificuldade na contratação de bons motoristas, aqueles realmente responsáveis e que estejam dentro do perfil desejado pela empresa. Ressente-se da falta de treinamento adequado e, para isso, destaca o trabalho realizado pela unidade local do Sest/Senat nessa área. Rubem e Vera concordam que a banalização do termo logística no transporte rodoviário de cargas é prejudicial para a atividade, principalmente para as empresas que buscam o constante aprimoramento, enquanto outros que nem ao menos sabem o significado das palavras que ostentam em seus caminhões anunciando "transporte e logística". No trecho, quase alheios ao assunto, os motoristas têm outras preocupações, quase todas referentes à necessidade de rodarem cada vez mais e com mais rapidez.

O carreteiro Ilton Ferreira da Silva, 45 anos e 23 de profissão - natural de São José do Ouro/RS - é agregado de uma grande empresa de transporte e logística e viaja para todas as partes do País. Lembra que, de uma maneira geral, a rotina das viagens é parecida, com a previsão da hora de chegada ao destino e dos locais de paradas e descanso. Todavia, reclama das inúmeras vezes em que precisa levantar às 5h da manhã e depois de ficar o dia inteiro esperando, acaba pegando uma carga expressa para um lugar distante e precisa tocar direto, "isso depois de ter levantado cedo e passado o dia sem fazer nada".

Garante que quem diz que não usa rebite está mentindo. "Não tem organismo que resista", salienta. Ele cita como exemplo uma viagem de Caxias do Sul/RS a São Paulo/SP que deve durar cerca de 20h e muitas vezes precisa ser feita expressa, em 16h. "Considerando-se que o motorista só vai pegar a estrada tarde da noite, é uma loucura". Segundo ele, o esquema adotado pelas empresas de transporte e logística são prejudiciais ao motorista, porque precisam despachar as cargas com urgência, atendendo aos interesses dos clientes que não podem ficar sem o produto.

Lembra que todas as empresas cobram o cumprimento de horários, porém nenhuma dá um prêmio de reconhecimento aos motoristas que conseguem cumprir as metas determinadas. Justamente por isso é que ele está negociando para comprar um caminhão e, "daí sim, ter liberdade para escolher o frete, o destino e os horários de suas viagens, com segurança". É o que pensa.

No caso do paranaense de Cascavel, Milton José Szlachta, 44 anos e 25 de estrada, as viagens são mais tranquilas e sem prazos rígidos. Ele dirige uma carreta transportando aço e papel entre os Estados do Paraná e do Rio Grande do Sul e garante que para a empresa em que trabalha, "quem faz a viagem é o motorista". Ele tem um horário definido para pegar a estrada, refeições ou descanso. Não dirige à noite, a não ser em casos extremos ou quando falta pouco para chegar ao destino da viagem. "Quando viajo à noite é por minha vontade e não por determinação do patrão", diz. Nunca trabalhou e nem pretende trabalhar em empresas de logística, que exigem muito do motorista, pois sempre precisam ficar atentas aos interesses dos clientes, que podem precisar da mercadoria a qualquer hora e com prazos curtos, salienta.

Outro carreteiro que não pretende trabalhar como agregado em empresas de transportes e logística, "por causa da pressa", é Jaime Pfeifer, 48 anos e 21 de estrada e natural de Caxias do Sul/RS. Dono do caminhão, ele roda por todo o País e prefere itinerário e cargas que lhe permitam viajar sossegado, sem muita pressa e com segurança, parando quando for preciso. Não trafega à noite, "porque a noite foi feita para dormir".

Pfeifer comenta que a tendência é de todas as grandes empresas se transformarem em operadoras de logística, com armazenagem e redespachos de cargas, muitas vezes com urgência, já que a maioria das indústrias não quer manter estoques por causa dos custos. "O caminhão vira o depósito e é preciso tocar rápido para não faltar matéria-prima na linha de produção, forçando o motorista a cumprir horários muito espichados, num ritmo que não me serve," conforme diz. Segundo ele, já não servia quando era mais moço e não vai ser agora, com toda a experiência adquirida nas estradas que vai começar a fazer loucuras. "É preciso parar para dormir, descansar e dirigir com segurança".

O autônomo Ademir Samistraro, 32 anos e quatro de profissão, é dono de um Ford Cargo 2009 e viaja pelos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo. Natural de Tangará/SC, antes de se tornar carreteiro trabalhava na agricultura com o pai. Comprou o caminhão e se associou a uma cooperativa de transportes que faz a intermediação das cargas, inclusive das negociações sobre os valores dos fretes. Está contente e não tem queixas, embora na maioria das vezes precise obedecer a horários e prazos rígidos para a entrega das cargas. Confessa que não sabe muito bem como funciona o esquema de logística no transporte de cargas, mas acredita que não seja muito diferente do que faz, ou seja, tudo com prazos e horários pré-definidos. "Tudo é muito complicado e é preciso coragem para enfrentar o desafio de ser autônomo".

Para o carreteiro Antenor Marin, 49 anos e 28 de profissão, também dono do caminhão, o melhor mesmo é carregar para empresas médias e pequenas que não fazem muitas exigências e se pode trabalhar com mais liberdade. Natural de Antônio Prado/RS, Marin viaja para onde tiver carga, "não tem destino certo", mas sempre procura negociar bem o valor do frete e os prazos de entrega. Confessa que não sabe como funciona o trabalho das empresas de logística, apenas por ouvir falar, mesmo assim sabe que não lhe serve. Pensa em trabalhar com calma, ganhando o suficiente para o sustento da família até a aposentadoria. Depois pretende vender o caminhão e comprar uma sala comercial para alugar e garantir uma renda extra para a velhice, afirma sorrindo.

Depois de dirigir uma carreta com equipamentos de som de uma banda de músicas gauchescas, nos Estados da região Sul, Adilson Oliveira Coelho, 34 anos e três de estrada, trabalha agora com uma carreta carregando máquinas agrícolas para exportação, de Curitiba/PR até Uruguaiana/RS, na fronteira do Brasil com a Argentina, onde é feito o transbordo para outros caminhões que as levarão para Argentina, Chile ou Bolívia.

Garante que tudo é feito dentro de uma operação de logística, com todos os detalhes da viagem programados, como horário de direção, para paradas e para dormir e velocidade limitada nos 80 km/hora. "Chego às 18h e encosto até às 5h da manhã", afirma. Segundo ele, ninguém fala nada em logística para os motoristas, embora todos saibam que existe, mas ninguém sabe o que é e nem como funciona. "Afinal, a gente só precisa dirigir e fazer certo o que nos mandam fazer e pronto", ressalta, sem grandes preocupações.
FONTE: O Carreteiro

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